Quem sabe o que regressa e o que finda?
Quem sabe que finda ou que permanece,
o que termina quando nada nasce
sem que terminem tronos, templos, rosas?
Quem sabe que mistério é uma vida
vertida num papel, letra por letra?
Os corvos, por exemplo, nas ruínas,
às bicadas nesse desenho belo,
num dia de passeio, até Bembibre.
A lebre espedaçada na valeta.
Junto ao mar os olhos do peixe morto
– as guelras sobre a areia – e o marmelo
podre no outono no chão da árvore
são mostras de quê?, são sinais de quê?
Que mensagem oculta, entre caminhos
de terra leve, lírios envasados,
a fonte que repete: nunca, nunca?
E no jardim as folhas desse choupo
que treme ao sol nas tardes de Setembro
davam sombra ao poema, ao livro aberto.
Ao levantar os olhos, quanta calma.
Como falavam entre si as nuvens
que juntas viajam, suaves, lentas,
fora de horário, noutro sem medida.
Isso é notícia de uma Lei mais justa?
Isso é amor, piedade ou indício
de que escondido atrás do muro branco
está mais do que sabe o que mais sabe?
[…]
A Névoa – Tradução de Joaquim Manuel Magalhães (Averno 012)